Para os “de Casa” e
os “ de fora”
“Em
nome dos Santos Reis e do Santo Filho de Maria!!!”
A
cultura nordestina sempre surpreende com um espetáculo de sons , cores e
sentidos. Na posição de “abiã”[1] da
cultura baiana, disposto a iniciar-me nos mistérios sagrados do povo, quero
dizer de um festejo de Reis ocorrido no interior da Bahia na cidade de Feira de
Santana.
A
tradição da festa de Reis é essencialmente católica e mui antiga. A devoção aos
Santos Reis surge nos primórdios da Cristandade abrilhantando ainda mais os
festejos natalinos onde o “Sol”[2]
que nasce do alto nos visitou graças a misericórdia de nosso Deus conforme a oração
de Zacarias. Segundo o Evangelho de Mateus e tradição da Igreja, três reis
guiados por uma estrela e por sabedoria divina chegaram à casa do Menino Jesus
oferecendo-lhe presentes de ouro, mirra e incenso. Segundo a tradição possuíam o
nome de Gaspar, Melchior e Baltazar sendo este último de tez escura.
A
liturgia da Igreja marca o dia seis de Janeiro para os festejos dos Santos
Reis. No Brasil geralmente é atribuído o domingo seqüente a esta data para a
celebração dos Reis Magos nas Igrejas com titulo de festa da Epifania do Senhor.
Para comemorar a data acontecem além das celebrações solenes pela Igreja, as
folias e os reisados do povo. Em Minas Gerais, geralmente se chama Folia de
Santos Reis na Bahia há as variações de Terno, Terno de Reis e Reisado. Estas
manifestações se dão em âmbito popular sob influência africana, atestada,
sobretudo pelas danças e instrumentos musicais utilizados. A linguagem simples
usada nas cantigas e orações caracteriza a identidade do reisado como algo realmente
popular, de gente humilde e de muita fé. Possivelmente foram os escravos que
engendraram estes festejos populares tal como podem ser vistos até hoje. Toda
folia, música, dança e cores é empregado no festejo sempre sinalizando a
alegria de ter entre nós o “Emanuel”.
O
grupo do reisado se reúne num ponto estratégico, e, peregrina por algumas casas
da região com seus cânticos e danças típicos fazendo memória à visita dos Santos
Reis. São realizadas cantigas para que a dona ou dono da casa abra a porta para
acolher o reisado. Aberto o portão da casa forma-se um delicioso clima de descontração
com muita alegria, música e dança. Há ali alguma merenda para os visitantes,
pois em geral nos festejos de origem africana se alimenta o espírito e o corpo.
O alimento é que dá a energia para a dança, cria o ambiente de confraternização
e partilha. Na saída é solicitado que se pague aos Santos Reis. Pagar o “Santo
Reis” é a maneira efetiva de contribuir para o festejo, demonstração de
contentamento e gratidão. Aqui são respeitadas as condições de cada família e
cada um dá aquilo que pode.
Como
os Reis Magos reconheceram em Belém o Sagrado manifestado na humanidade de uma
criança com seus santos pais, o reisado de alguma forma reconhece e adora o
Sagrado em cada família que visita. O reisado re-visita e exalta a vida em cada
família que entra. Por isso é preciso haver festa e tudo que denote vida como
cores alegres, sons e comidas. Cada participante faz uso de seu direito cristão
de “Rei e Sacerdote” [3]
para visitar e reconhecer, tal como os Santos Reis, o Sagrado revelado no âmago
de cada residência que os acolhe. Este Sagrado é o Outro que no momento do
reisado é destituído de sua secularidade para tornar-se divinamente
participante da Epifania do Menino Deus. A Dona da casa assim como Nossa
Senhora é o elemento feminino que zela pelo conforto dos visitantes com
singular afeição. O Pai ou Irmão mais velho é por analogia São José que
vigilantemente zela pelo lugar e ajuda no serviço a quem chega. Os demais da
casa são convivas do Menino Deus
igualmente divinos. Assim é recordado o acontecimento da visita dos Reis à Criança
de Belém sob o signo da alegria e da esperança, pois “um menino nasceu, o mundo tornou a começar!” [4].
Acredito ser esta a mensagem do reisado: reconhecer e visitar o Sagrado no Humano.
Tudo isso feito com muita alegria, esperança, fé e confiança na Boa Nova
trazida pelo Menino.
Que
esta tradição perdure por muitos anos nas ruas do Bairro dos Eucaliptos em Feira
de Santana. Pois é aí que reside a força de um povo.
Viva meus Santos Reis!!!Viva meus
Santos Reis!!!
Viva meus Santos Reis!!!
Coroado! Viva meus Santos Reis!!!
Thiago Felipe L. Mata